Não cabe a condição de vítima ao agressor da mulher na Vara Maria da Penha em Manaus

Não cabe a condição de vítima ao agressor da mulher na Vara Maria da Penha em Manaus

O Desembargador Abraham Peixoto Campos Filho, do Tribunal de Justiça, ao solucionar conflito de competência entre a 1ª Vara de Violência Doméstica e o 19º Jecrim, de Manaus, fixou pela impossibilidade de que haja conexão entre dois processos, ainda que entre os mesmos ocorra um vínculo jurídico, se um deles já tiver sido julgado, embora a decisão desse julgamento esteja noutra esfera hierárquica, no caso a Corte de Justiça, em grau de recurso. É, resumidamente, a aplicação do disposto no artigo 55,§ 1º do CPC, parte final, onde se fixa o afastamento da regra de reunião de processos para decisão conjunta se um deles já houver sido sentenciado. Por consequência, fixou a competência do juízo suscitado, o Juizado Especial Criminal, se afastando a possibilidade de que o agressor figurasse na condição de vítima no Juizado Maria da Penha.

Os fatos envolvidos envolveram conflito familiar, no âmbito da violência doméstica. Num dos processos, uma das partes, vítima mulher,  havia obtido medidas protetivas de urgência contra o ex- companheiro. Ocorre que, ainda nesse particular aspecto, um dos pontos a serem examinados é o de que a medida protetiva de urgência possui natureza autônoma e satisfativa, inibindo a prática de outros atos de violência, produzindo efeitos enquanto vigente para afastar o perigo de agressão à integridade física e psicológica  contra a vítima  e não se vincula à ação penal.

A medida protetiva de urgência se presta à preservação cautelar do bem estar psicológico e físico da mulher, vítima de violência doméstica, diversamente de uma provável ação penal que se presta a uma investigação criminal em juízo dentro do contraditório e da ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, o que, a prima facie, no caso concreto, teria de plano evidenciado uma ausência de conexão com os fatos levados ao juizado especial criminal, em que o agressor teria se colocado na situação de vítima da ofendida.

Nesse enquadro técnico, não haveria a também possiblidade de conexão e a não também incidência da competência do Juizado da Violência Doméstica, pois a vítima fora colocada na condição de agressora do ex companheiro, o que se revelaria incompatível com o rito dos juizados da violência doméstica e se pondo fim ao entendimento do juízo suscitado que haveria uma conexão entre o processo em que o agressor narrou ter sido vítima de ameaça por sua ex-companheira, que teria medidas protetivas já deferidas na Vara Maria da Penha. Essa conexão não existe, mormente quanto as aspecto de que as medidas protetivas já tenham sido decididas, ainda que tenham sido  alvo de recurso.

O Superior Tribunal de Justiça tem posicionamento sobre a matéria debatida, firmando que as medidas protetivas da Lei 11.343/2006, observados os requisitos específicos  para a concessão de cada uma, podem ser pleiteadas de forma autônoma para fins de cessação ou de acautelamento de violência doméstica contra a mulher, independentemente da existência, presente ou potencial, de processo crime ou ação principal contra o suposto agressor.

Noutro aspecto jurídico, fora a hipótese de se sustentar a linha de raciocínio do juízo suscitado, então afastado pela decisão que fez findar o conflito, seria permitir que a conduta de uma mulher, em tese, praticada contra o companheiro, fosse processada no Juizado da Violência Doméstica. Entretanto, para a fixação dessa competência, é inafastável que a vulnerabilidade da vítima mulher esteja patente, no status de ofendida, não se admitindo a hipótese de que seja colocada no lugar de ofensora.

Leia o acórdão:

Processo: 0728332-13.2021.8.04.0001 – Conflito de Competência Cível, 1º Juizado Especializado da Violência Doméstica (Maria da Penha) Suscitante : Juízo de Direito do 1º Juizado Especializado da Violência Doméstica e Familiar Contra A Mulher (Maria da Penha).
Suscitado : Juízo de Direito da 19ª Vara do Juizado Especial Criminal da Comarca da Capital.  Terceiro I : Ministério Público do Estado do Amazonas. Relator: Abraham Peixoto Campos Filho. Revisor: Revisor do processo Não informado EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE O JUÍZO DE DIREITO DA 1.ª VARA DO JUIZADO ESPECIALIZADO
DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER (MARIA DA PENHA) (SUSCITANTE) E O JUÍZO DE DIREITO DA 19.ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL (SUSCITADO), AMBOS DA CAPITAL. TERMO CIRCUNSTANCIADO DE OCORRÊNCIA. CONEXÃO COM REQUERIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA JÁ JULGADO. REUNIÃO DESCABIDA. SÚMULA 235 DO STJ. PROCEDÊNCIA DO CONFLITO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO.-

 

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