Sentença da 15ª Vara Cível de Manaus declara a conversão de contrato de cartão de crédito consignado para empréstimo simples, condena a Facta Financeira à devolução em dobro e fixa em R$ 10 mil a indenização por danos morais.
Mesmo tendo recebido o valor contratado, um consumidor conseguiu na Justiça do Amazonas o reconhecimento da ilegalidade na forma de contratação de um cartão de crédito consignado com reserva de margem.
A decisão destaca que a manifestação de vontade do autor restringia-se ao empréstimo consignado simples, e que o banco não comprovou ter prestado informações claras, objetivas e adequadas sobre a modalidade contratada.
Segundo a sentença, prolatada no processo nº 0572438-39.2024.8.04.0001, a instituição financeira disponibilizou R$ 3.227,15 por TED, mas vinculou o valor a um contrato de cartão de crédito consignado com Reserva de Margem Consignável (RMC) — operação que se distingue do empréstimo comum justamente por gerar cobrança indefinida de parcelas mínimas, recalculadas com incidência de juros rotativos sobre o saldo devedor, o que frequentemente conduz a endividamento contínuo.
“Em tendo ela recebido o valor do empréstimo sem lhe ter devolvido ao réu, certo é que volitivamente o desejou em sua modalidade pura ou simples”, afirma a juíza. Contudo, destaca que a autora “tem o direito de estabelecer discussão sobre a contratação do cartão de crédito, pois inadmitido tal negócio”.
A decisão segue a tese 2 do IRDR n.º 0005217-75.2019.8.04.0000 (Tema 5 do TJAM), que exige a comprovação inequívoca de que o consumidor foi informado, de maneira clara e compreensível, sobre: os meios de quitação da dívida; as consequências do pagamento parcial (com incidência de encargos rotativos); o modo de acesso às faturas; e a conversão automática da RMC em débito mensal mínimo.
Como o banco não apresentou documentação que atenda a esses requisitos, a contratação foi considerada viciada, por erro substancial quanto ao objeto, e os encargos do cartão foram reputados ilegais. O negócio foi, então, convertido em empréstimo simples, com juros compatíveis com essa modalidade.
Além disso, o Juízo reconheceu a existência de dano moral in re ipsa, ou seja, presumido pela violação ao direito de personalidade e à confiança legítima do consumidor, determinando o pagamento de R$ 10 mil a esse título.
A sentença também condenou o banco à restituição em dobro dos valores descontados entre novembro de 2021 e agosto de 2024, período posterior à modulação de efeitos fixada pelo STJ no Tema 929.
“O dano moral é ocorrente, pois o réu dirigiu sua atividade comercial para impor ao autor, sujeito hipossuficiente informacional, a contratação de empréstimo simples como se fosse sob a modalidade de cartão de crédito consignado em onerosidade excessiva”, conclui a magistrada.
A condenação inclui ainda custas processuais e honorários de 10% sobre o valor da condenação, fixados com base na complexidade da causa. A decisão ressalta que embargos de declaração não poderão ser utilizados com intuito de rediscutir o mérito, sujeitando a parte ao pagamento de multa em caso de uso protelatório.
Processo nº 0572438-39.2024.8.04.0001