Um estabelecimento de serviço funerário de São Luís foi condenado a pagar indenização por danos morais às famílias de dois idosos, devido à troca dos corpos entregues aos familiares para sepultamento. Na sentença, o juiz titular da 3ª Vara Cível da Capital, Márcio Castro Brandão, destaca que houve falha na prestação do serviço configurado pelo abalo emocional dos demandantes ao se depararem com o corpo de pessoa desconhecida, no momento do velório e no cemitério.
“Ademais, a circunstância de ter sido identificado o corpo pelos demandantes, antes do velório e enterro, não afasta a conclusão de que era responsabilidade da ré executar os serviços funerários a contento e zelar pela entrega do cadáver correto e em condições para a cerimônia de sepultamento”, afirma o magistrado. O juiz condenou a funerária a reparar os danos morais, com o pagamento R$ 50 mil para cada demandante, totalizando o montante em R$ 150 mil, corrigidos monetariamente pelo INPC, acrescidos de juros legais. O estabelecimento também terá que restituir o valor da taxa que a família de um dos idosos pagou pelo serviço de aplicação de formol e que não foi realizado.
Conforme os autores da ação, os idosos, respectivamente com 96 e 76 anos, tiveram seus óbitos comprovados por causa natural na mesma data e horário aproximado, em suas residências; que depois de toda burocracia junto ao Serviço de Verificação de Óbitos no Instituto Médico Legal (IML), os corpos permaneceram durante a noite na funerária, para dar início ao velório, no dia seguinte, com sepultamento em cemitérios diferentes.
Ainda, de acordo com os demandantes os corpos foram vestidos com trajes cerimoniais pertencentes ao outro, além dos caixões também terem sido trocados. Relatam que o equívoco foi constatado pela família de um dos idosos, no momento do velório e da abertura do caixão, faltando poucas horas para o cortejo até o cemitério. Já os familiares do outro idoso perceberam que o caixão não estava dentro do veículo funerário durante o cortejo. Acionada, segundo os familiares, a funerária informou acerca do erro e que outro carro estaria a caminho para realizar o reconhecimento e destroca dos corpos.
Consta na ação que os familiares já estavam tomados pelo cansaço e angústia de confirmação quanto ao ente falecido; que mesmo retirando o caixão, a capela ficava longe do local do enterro, o que causou mal-estar em muitos idosos presentes; que os caixões foram deixados no chão, sem qualquer cuidado ou desculpas, com horário do sepultamento para expirar; que diante de toda emoção, não restando mais tempo para velar o corpo correto, apressaram-se em enterrar o corpo sem quaisquer cerimônias religiosas ou despedidas finais. Os autores da ação também informaram que a família de um dos idosos é evangélica, e como fora enterrado com as roupas do outro idoso que era católico praticante, junto ao corpo foi um rosário, e que o idoso católico acabou sendo sepultado sem o objeto que expressava sua fé e religiosidade.
Na contestação, a funerária afirmou que as mortes em domicílio precisam passar pelo IML e, ao que tudo leva a crer, a troca de corpos aconteceu no Instituto Médico, no momento da liberação. Também argumentou que “casos de troca de corpos são recorrentes no IML, não pelo agente funerário, pois este somente recebe o corpo, acompanhado da documentação”. Já no mérito da ação, o estabelecimento funerário defendeu que a cronologia dos fatos captados pelo circuito interno do laboratório do réu evidencia que não houve troca de cadáver das urnas mortuárias.
Na decisão o juiz destacou que a ré, encarregada das relevantes tarefas consistentes ao recebimento dos corpos, manuseio e transporte, deve adotar todas as providências necessárias e a mínima diligência para permitir a preparação e traslado para o velório, sobretudo na condição de agente funerário conhecedor de que eram recorrentes casos de trocas de corpos no IML, conforme matérias veiculadas e anexadas pela própria parte aos autos.
“Assim, a responsabilidade civil da requerida encontra-se suficientemente caraterizada, haja vista a presença dos elementos da conduta, representada pela falha no serviço funerário (dano), configurado pelo abalo emocional dos demandantes ao se depararem com o corpo de pessoa desconhecida (nexo causal), no momento do velório e no cemitério”, afirma o juiz.
Ainda, conforme a decisão do magistrado, “da análise das provas coligidas, não remanesce dúvida que houve falha que culminou na troca de cadáveres, reconhecida, inclusive, na contestação”, destacou. Também afirmou que não deve prevalecer o argumento da funerária de transferir a responsabilidade da troca dos corpos por agentes do IML.
Com informações do TJ-MA