Concessionária de rodovia não pode cobrar de autarquia de saneamento pelo uso da faixa de domínio

Concessionária de rodovia não pode cobrar de autarquia de saneamento pelo uso da faixa de domínio

Em julgamento de Incidente de Assunção de Competência (IAC), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que “é indevida a cobrança promovida por concessionária de rodovia, em face de autarquia prestadora de serviços de saneamento básico, pelo uso da faixa de domínio da via pública concedida”.

Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso da administradora de uma rodovia para que a autarquia de saneamento tivesse de pagar pelo uso de parte da faixa de domínio, necessária à passagem de rede coletora de esgoto para atender uma universidade, um hospital estadual e uma unidade da Polícia Militar.

O colegiado acompanhou a relatora, ministra Regina Helena Costa, para quem não seria legítimo o poder concedente delegar a gestão da via a um particular e este cobrar do próprio poder público – mesmo que de outra esfera federativa – pelo uso do espaço. Se a rodovia estivesse fora do regime de concessão, ressaltou a ministra, essa cobrança não seria possível.

Em seu voto, a relatora lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar o Tema 261, com repercussão geral, afastou a possibilidade de cobrança de tributo (taxa) pelo uso da faixa de domínio por concessionária de serviço público, quando a via é administrada pelo Estado.

Para a magistrada, ainda que o posicionamento do STF tenha sido extraído de hipótese distinta da que estava em análise no STJ, ele se assentou no fundamento de que a utilização da faixa de domínio para viabilizar a consecução de serviço público diverso da destinação ordinária do espaço não lhe retira a natureza de bem público de uso comum do povo.

Citando outros julgados da Suprema Corte, a ministra concluiu que, “embora cedido ao particular, o bem público de uso comum do povo, na ótica revelada pelo STF, não se desnatura, permanecendo, pois, afetado à destinação pública, motivo pelo qual se afigura ilegítimo exigir remuneração pela sua utilização, quando voltada a instrumentalizar a execução de serviço público, como ocorre na espécie”.

Na jurisprudência do STJ, Regina Helena Costa verificou que a Primeira Seção adotou soluções jurídicas diversas conforme as partes presentes nas demandas, mas não chegou a discutir a situação em que uma empresa privada (concessionária da rodovia) exige de autarquia prestadora de serviço público o pagamento pelo uso da faixa de domínio.

Segundo a relatora, o STJ considera legítimo que a concessionária da rodovia exija o pagamento de outra concessionária (empresa privada contra empresa privada), desde que a cobrança esteja prevista no contrato de concessão, nos moldes do artigo 11 da Lei 8.987/1995.

Por outro lado, nos casos em que a rodovia é administrada por ente federado, de forma centralizada ou descentralizada, e a cobrança se dirige a concessionária de serviço público (Estado contra particular), “é assente a ilegalidade da exigência, seja porque não cabe a fixação de preço público, uma vez que o uso do espaço se reverte em favor da sociedade, seja porque a natureza do valor cobrado não é de taxa, porquanto ausentes a prestação de serviço público ou o exercício do poder de polícia”.

Impossibilidade de cobrança quando o Estado participa da relação

Regina Helena Costa ressaltou que a regra do artigo 11 da Lei 8.987/1995 abrange interações entre concessionárias, “sendo inapta para embasar cobrança pelo uso da faixa de domínio quando, sob regime de exploração direta ou indireta, o Estado participe da relação processual, seja na qualidade de gestor da rodovia e autor da cobrança, seja na condição de sujeito passivo, quando lhe é exigido o pagamento pela utilização do espaço por empresa privada administradora da via”.

Dessa forma, a ministra afirmou que o dispositivo legal não valida, em desfavor de autarquia prestadora de serviço de saneamento, a exigência de pagamento pelo uso da faixa de domínio, pois tal utilização é necessária à saúde coletiva. “Se da própria previsão legal não se pode extrair a anuência para a cobrança enfocada, não surtirá efeitos obrigacionais, por conseguinte, eventual cláusula do contrato de concessão que preveja a exigência em face de pessoa jurídica de direito público”, concluiu.

Leia o acórdão

Fonte: STJ

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