Para o ministro do STF, uso de “ferro de solda” para abrir o equipamento reforça violação de cautelares e risco à ordem pública.
A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, parte de um ponto central: para ele, a avaria identificada na tornozeleira eletrônica usada por Jair Bolsonaro (PL) — e admitida pelo próprio ex-presidente em vídeo — teria sido crucial para caracterizar violação das medidas cautelares impostas no processo da chamada trama golpista.
Com base nessa interpretação, Moraes decretou a prisão preventiva na madrugada deste sábado (22) e ordenou que a defesa esclareça, em 24 horas, o motivo da tentativa de abertura do equipamento.
No relatório da Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal, assinado por Rita Gaio, o equipamento apresentava “marcas de queimadura em toda a circunferência” do ponto de fechamento. O alerta de violação acionou a equipe às 0h07, levando à constatação de que a versão inicial — de impacto em escada — não correspondia às características do dano.
Em vídeo incorporado aos autos, Bolsonaro afirma ter usado “ferro quente, ferro de soldar”, justificando o episódio por “curiosidade”. Para Moraes, esse trecho representa confissão espontânea e reforça a tese de descumprimento das cautelares. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, alinhou-se ao entendimento, citando urgência e gravidade dos novos elementos.
A PF cumpriu a ordem por volta das 6h, levando o ex-presidente à Superintendência em Brasília, onde permanece em cela individual. Três vetores: a avaria, a mobilização e o risco de fuga — segundo Moraes. Em sua fundamentação, Moraes descreveu três eixos que, no seu entendimento, justificariam a preventiva: A avaria deliberada da tornozeleira, agora sujeita à perícia; a movimentação convocada por aliados, vista como potencial estímulo a instabilidade; a possibilidade de fuga, incluindo menções a deslocamento para a embaixada dos EUA.
O ministro não afirma que cada um desses elementos está comprovado de forma autônoma, mas argumenta que, somados, configurariam risco concreto à ordem pública e ao andamento da investigação.
Aqui, a decisão se desloca para o campo interpretativo: Moraes sustenta que a conduta, mesmo narrada de modo informal e ainda sujeita a esclarecimentos técnicos, revela intenção de burlar a fiscalização eletrônica — ponto que transforma a aparente curiosidade em possível violação qualificada.
Defesa e aliados contestam narrativa; Moraes mantém a presunção de risco
A defesa reagiu afirmando que a prisão foi decretada com base em uma “vigília de orações”, ato que, segundo os advogados Celso Vilardi e Paulo Bueno, estaria protegido pela liberdade constitucional de culto. Eles dizem que a decisão causa “profunda perplexidade” e prometem recorrer.
Parlamentares da oposição classificaram como “narrativa” a suposta tentativa de danificar a tornozeleira. Antes da divulgação do relatório e do vídeo, o deputado Zucco (PL-RS) chegou a afirmar não haver “nenhum elemento” que confirmasse o episódio.
Do outro lado, Moraes registra no despacho que os vídeos, o relatório e a fala do próprio investigado apontariam em direção contrária — embora não encerrem a discussão técnica.
