Nos crimes de ação penal pública condicionada, a representação da vítima dispensa formalidades específicas e pode ser configurada pelo comparecimento do ofendido à delegacia para narrar o fato, identificar o autor e manifestar, de forma inequívoca, o desejo de ver o caso apurado — sendo o boletim de ocorrência a formalização desse ato.
Esse entendimento foi reafirmado pelo ministro Rogério Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça, ao negar provimento a agravo em recurso especial interposto por réu acusado de ameaça (artigo 147 do Código Penal) no Amazonas.
O Tribunal de Justiça do Estado havia acolhido recurso em sentido estrito do Ministério Público para afastar a extinção da punibilidade por decadência, determinando o prosseguimento da ação penal. A defesa sustentava que não houve manifestação expressa da vítima para que o acusado fosse processado.
Para o relator, “a intenção de representar pode ser extraída da existência de boletim de ocorrência e do depoimento prestado em delegacia ou em juízo”. No caso concreto, o acórdão estadual registrou que “a vítima compareceu à Delegacia de Polícia, onde relatou os fatos com clareza e identificou o autor da infração penal, situação que demonstra, de forma inequívoca, a intenção da vítima de autorizar o início da persecução penal. O seu comportamento preenche os requisitos legais de uma representação válida e tempestiva, afastando, assim, o reconhecimento da decadência”, registrou o Ministro.
O Ministério Público Federal também opinou pelo desprovimento do recurso, ressaltando que, especialmente em casos de violência doméstica e familiar, o ato de a vítima procurar a autoridade policial, relatar o crime e identificar o acusado é manifestação inequívoca suficiente para deflagrar a persecução penal.
O relator aplicou as Súmulas 83 e 7 do STJ — a primeira, por consolidar a orientação de que não se exige formalidade específica para a representação; a segunda, por vedar o reexame de provas no recurso especial.
NÚMERO ÚNICO:0600731-93.2022.8.04.3200