Por João de Holanda Farias, Advogado
É incontestável que o Supremo Tribunal Federal ocupa o centro da arena política e institucional brasileira. O tribunal se tornou o vértice das grandes disputas nacionais — das mais legítimas às mais controversas. Mas é igualmente irrefutável que essa onipresença cobra um preço: a confiança na Corte se degrada na mesma medida em que seus atos se distanciam da contenção institucional.
A pauta suprema, cada vez mais ampla, parece não reconhecer limites temáticos ou prudenciais. A judicialização excessiva da política, combinada à politização de suas próprias decisões, transforma o STF em protagonista de uma instabilidade institucional recorrente. A função contramajoritária, que deveria ser escudo da Constituição, vem sendo usada, muitas vezes, como espada contra escolhas políticas legítimas dos demais Poderes.
Mais recentemente, esse desequilíbrio se manifestou de forma sutil, mas preocupante, no debate sobre os atos de 8 de janeiro. Em meio a propostas divergentes — entre os que defendem uma anistia ampla e os que propõem apenas a readequação penal de condutas menos graves — ganhou espaço a ideia de que o projeto, antes mesmo de ser votado, deve ser submetido informalmente ao crivo do STF, sob a justificativa de evitar inconstitucionalidades.
Trata-se de um movimento perigoso. O Judiciário não pode ser transformado em tutor prévio do Legislativo. A Constituição não autoriza um “controle preventivo” de ideias legislativas, sobretudo quando formuladas por parlamentares legitimamente eleitos.
Esse movimento não é imune à corrosão. O tempo revela, com clareza, que a autoridade que não se ancora na sobriedade tende a perder sustentação. O Supremo pode decidir sobre tudo — mas não sem consequências. E a mais grave delas é a perda progressiva de legitimidade, o que, ironicamente, o enfraquece quando mais se impõe.
É hora de o STF refletir se deseja ser Corte Constitucional ou supergoverno. Porque, no ritmo atual, corre o risco de não ser reconhecido como nenhum dos dois.