Quando o Ministério Público entra com uma ação para defender os direitos dos consumidores, ele pode pedir que a empresa seja obrigada a provar que agiu corretamente.
É o que se chama de inversão do ônus da prova — um mecanismo previsto no Código de Defesa do Consumidor que ajuda a equilibrar a disputa judicial, principalmente quando só a empresa tem acesso às informações técnicas,definiu o Juiz Lucas Couto Bezerra.
Em decisão que aplica mecanismo de defesa dos consumidores, o juiz Lucas Couto Bezerra, da Vara Única da Comarca de Barreirinha (AM), determinou que a concessionária Amazonas Distribuidora de Energia S.A. apresente provas de que prestou o serviço de forma adequada e contínua durante o período das eleições de 2024.
A medida foi adotada no curso da Ação Civil Pública nº 0602528-81.2024.8.04.2700, ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Amazonas, e se baseia na inversão do ônus da prova prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Segundo o Ministério Público, as comunidades afetadas sofrem há anos com a precariedade do fornecimento de energia elétrica, o que ficou ainda mais evidente no contexto eleitoral. Embora a concessionária tenha a obrigação legal e constitucional de prestar o serviço de forma eficiente, segura e contínua, as falhas persistentes indicam descumprimento tanto das normas da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) quanto da própria Constituição Federal.
Na petição inicial, o MP destacou que há flagrante descaso da concessionária com os moradores de Barreirinha e que a empresa não vem promovendo as melhorias necessárias nas instalações, especialmente nas zonas rurais e ribeirinhas. A relação de consumo entre os usuários e a concessionária é incontroversa, o que justifica a aplicação das normas do CDC e a atuação do Ministério Público como substituto processual dos consumidores, definiu o Promotor de Justiça.
Ao proferir a decisão, o juiz reconheceu que cabe à concessionária, por possuir domínio técnico e acesso aos registros operacionais, comprovar a regularidade da prestação do serviço. Para tanto, aplicou a teoria dinâmica do ônus da prova, segundo a qual o dever de provar deve recair sobre quem tem melhores condições de produzi-lo.
Esse entendimento encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que no REsp 1.253.672/RS, sob relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, afirmou que a inversão do ônus da prova pode ser aplicada mesmo quando o Ministério Público atua como parte autora, visando à proteção coletiva dos consumidores.
As partes foram intimadas para indicar, no prazo de 15 dias, quais provas ainda pretendem produzir, com a devida justificativa. Também foi concedido prazo de cinco dias para eventuais pedidos de esclarecimento ou ajustes à decisão de saneamento parcial.
A ação segue em trâmite e poderá resultar na responsabilização da Amazonas Energia por eventuais danos causados à coletividade.
Processo n.: 0602528-81.2024.8.04.2700