A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou que a insatisfação do ofendido com a capitulação jurídica adotada pelo Ministério Público, em crimes de ação penal pública condicionada à representação — também conhecidos como ações penais de natureza mista —, não configura inércia ministerial e não autoriza o ajuizamento de queixa-crime privada.
O caso analisado envolveu queixa-crime apresentada por autoridade contra outra, com imputação, em tese, dos crimes de ameaça e violência política. O Ministério Público, contudo, ofereceu denúncia pelos mesmos fatos, mas os tipificou como injúria. Inconformada com o enquadramento penal, a parte ofendida propôs nova ação penal, alegando omissão do órgão ministerial e “proteção deficiente”.
O relator, ministro Antonio Carlos Ferreira, rejeitou a queixa e explicou que a ação penal privada subsidiária da pública só se admite diante da efetiva inércia do Ministério Público, e não por divergência quanto ao tipo penal.
“A discordância da ofendida quanto à tipificação dos fatos não autoriza a propositura de queixa-crime”, afirmou o ministro, frisando que a atuação do MP é pautada pela independência funcional e não está vinculada ao enquadramento sugerido pela autoridade policial ou pela vítima.
A Corte Especial acompanhou o relator por unanimidade e consolidou a tese de que: a ação penal privada subsidiária da pública é incabível na ausência de inércia ministerial; a discordância quanto à tipificação dos fatos não legitima o ajuizamento de queixa-crime; nos crimes contra a honra de servidor público, a representação ao Ministério Público preclui a via privada, conforme a Súmula 714 do STF.
O acórdão também destacou que, conforme o art. 383 do Código de Processo Penal, a emendatio libelli permite ao juiz atribuir nova definição jurídica aos fatos na sentença, o que reforça que a divergência sobre a capitulação não caracteriza omissão ministerial.
Com essa decisão, o STJ reafirma a fronteira conceitual entre legitimação concorrente e dupla persecução penal, deixando claro que, nas ações mistas, o exercício da titularidade pelo Ministério Público exclui o do ofendido, ainda que este discorde do enquadramento legal dado à conduta.