A Nona TRF 1 confirmou sentença da 3ª Vara Federal Cível do Amazonas e rejeitou recurso do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que tentava manter a suspensão de benefício previdenciário por invalidez e a cobrança de mais de R$ 62 mil por suposto recebimento indevido de um hanseniano, no Amazonas. Foi Relator o Desembargador Antônio Scarpa.
O caso envolveum um segurado, beneficiário de dois benefícios distintos: um amparo previdenciário por invalidez de trabalhador rural, concedido em 1984 com base na Lei nº 6.179/1974, e uma pensão especial paga pelo Estado do Amazonas, nos termos da Lei Estadual nº 1.735/1985, voltada a portadores de hanseníase com lesões incapacitantes.
O INSS, após cruzamento de dados, entendeu que o autor estaria acumulando irregularmente o benefício federal com uma pensão oriunda de regime próprio de previdência social (RPPS) estadual, o que ensejou: a suspensão do amparo previdenciário, e a instauração de processo administrativo de cobrança, com exigência de devolução de R$ 62.230,56.
Contudo, a Justiça Federal reconheceu que o segundo benefício não integra o RPPS, pois não decorre de vínculo funcional nem é pensionamento por dependência, tratando-se, na realidade, de pensão indenizatória com caráter assistencial, instituída por lei estadual para reparar os efeitos da segregação imposta a pessoas com hanseníase.
Acumulação lícita entre benefícios de naturezas distintas
O Desembargador Federal Antônio Scarpa, relator do caso no TRF1, destacou que a pensão estadual não possui natureza previdenciária, mas sim indenizatória, e tem semelhança estrutural e funcional com a pensão especial federal da Lei nº 11.520/2007, dirigida a ex-internados compulsoriamente em hospitais-colônia. Ambas têm como finalidade reparar danos históricos e garantir meios mínimos de subsistência a pessoas estigmatizadas por políticas públicas de segregação sanitária.
Assim, por não compartilharem o mesmo fato gerador e não decorrerem do mesmo regime jurídico, a acumulação entre o amparo previdenciário por invalidez rural e a pensão estadual especial por hanseníase é plenamente lícita e juridicamente possível, conforme expressamente autorizado pelo parágrafo único do art. 3º da Lei nº 11.520/2007, aplicado por analogia.
Fundamentação e precedentes
A decisão reafirma o entendimento do Supremo Tribunal Federal na ADI 6.096/DF, segundo o qual não se pode obstar a concessão ou restabelecimento de pensão especial por hanseníase em razão de decurso de tempo, sendo aplicável apenas a prescrição quinquenal das parcelas vencidas (Súmula 85/STJ).
Também foram citados precedentes da 1ª Câmara Regional Previdenciária do TRF1, que consolidam o entendimento de que benefícios com natureza indenizatória — como os pagos a hansenianos, seringueiros ou anistiados políticos — não se submetem à lógica restritiva da acumulação de aposentadorias ou pensões contributivas.
Com base nessas premissas, a Oitava Turma concluiu pela: legalidade da acumulação dos benefícios recebidos pelo autor; ilegalidade da suspensão do amparo previdenciário por invalidez; e nulidade do processo administrativo de cobrança instaurado pelo INSS.
Processo n. 1009246-40.2020.4.01.3200