Nos crimes de maus-tratos a animais (art. 32 da Lei 9.605/1998), a ausência de laudo pericial não impede a comprovação da materialidade delitiva quando há outros meios probatórios legalmente admitidos, como provas testemunhais e relatórios fotográficos, sendo inaplicável a absolvição por insuficiência de provas quando o conjunto fático-probatório é harmônico e robusto.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial interposto por um réu, condenado pela prática de maus-tratos a animais, previstos no art. 32, caput e §1º-A, da Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/98). No caso concreto, a justiça local apurou a denúncia de que cães da raça pitbull se encontravam amarrados em um terreno ao lado de uma casa, no Tarumã, em Manaus, sem água ou comida, e expostos a sofrimento. No STJ, a defesa contestou a ausência de laudo pericial.
A decisão, proferida pelo Ministro Carlos Cini Marchionatti (Desembargador convocado do TJRS), reforça a jurisprudência segundo a qual a ausência de laudo pericial não inviabiliza a comprovação da materialidade delitiva, desde que amparada por outros meios de prova.
Segundo o processo, o recorrente foi condenado à pena de 2 anos de reclusão, substituída por prestação pecuniária e multa, em razão da manutenção de dois cães em condições degradantes. Conforme consta nos autos, os animais eram mantidos acorrentados com correntes curtas e alojados em abrigo precário, sem proteção adequada contra intempéries.
A defesa sustentava nulidade do processo por falta de exame pericial, sob alegação de que o laudo seria imprescindível para demonstrar o sofrimento causado aos animais. Contudo, tanto o TJAM quanto o STJ entenderam que os relatos testemunhais e o relatório fotográfico da Delegacia Especializada em Crimes Ambientais (DEMA) foram suficientes para evidenciar a materialidade do crime, afastando a necessidade de perícia.
Segundo o relator, “a configuração do crime de maus-tratos prescinde da constatação de lesões físicas visíveis ou permanentes”, sendo bastante a demonstração de condutas que causem dor ou sofrimento, ainda que momentâneos, inclusive no aspecto psíquico dos animais.
O voto também destacou que o termo “maus-tratos” é elemento normativo do tipo penal, que comporta valoração cultural e social, abrangendo não apenas agressões físicas, mas também privações e negligência. Assim, alterar a conclusão das instâncias ordinárias quanto à suficiência da prova exigiria reexame fático-probatório, vedado pela Súmula 7 do STJ.
De acordo com os autos, a análise do caso permitiu concluir pela existência de dolo eventual, uma vez que ao prever a possibilidade de causar sofrimento aos animais, o envolvido aceitou o risco e prosseguiu com sua conduta. Assim ele próprio teria reconhecido a inadequação das condições a que submetia os animais, mas optou por mantê-los em situação precária sob a justificativa de uma suposta provisoriedade, cuja concretização não encontrou amparo na justificativa apresentada.
NÚMERO ÚNICO:0636212-48.2021.8.04.0001