A destruição constatada no processo se deu por corte raso, técnica de desmatamento em que toda a vegetação de uma área é completamente suprimida — sem deixar remanescentes arbóreos ou vegetação nativa.
A Justiça Federal do Amazonas, por meio da 7ª Vara Federal Ambiental e Agrária da SJAM, condenou um réu pela supressão ilegal de 85,17 hectares de floresta amazônica primária no município de Apuí, ocorrida entre agosto de 2017 e julho de 2018.
A sentença foi proferida pela juíza federal em auxílio Laís Durval Leite, no âmbito de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A destruição constatada no processo se deu por corte raso, técnica de desmatamento em que toda a vegetação de uma área é completamente suprimida — sem deixar remanescentes arbóreos ou vegetação nativa. O método, de alto impacto ambiental, compromete diretamente o ecossistema, a biodiversidade e o equilíbrio climático, sendo ilegal quando realizado sem autorização do órgão ambiental competente.
A magistrada reconheceu a responsabilidade civil objetiva e propter rem do requerido, com fundamento no art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente) e no art. 225 da Constituição Federal. A condenação impôs obrigações de fazer, não fazer e indenizar, conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que admite a cumulação dessas medidas como expressão do princípio da reparação integral do dano ambiental.
Fundamentos constitucionais, ambientais e processuais
A sentença destacou a natureza estrutural da ação civil pública ambiental, permitindo ao juiz interpretação ampliada dos pedidos e adaptação do processo à realidade dos fatos, com base nos arts. 322, §2º, 489, §3º e 493 do CPC. Essa postura jurisdicional legitima o tratamento flexível da demanda para assegurar efetividade na tutela de direitos difusos.
Com base no Laudo PRODES, elaborado pela Secretaria de Apoio Pericial do MPF por sensoriamento remoto, comprovou-se a supressão total da vegetação nativa — sem licença ambiental. O corte raso afetou ecossistema protegido por normas constitucionais e infraconstitucionais, caracterizando, assim, dano ambiental presumido.
A juíza considerou a vinculação do réu à área degradada pelos registros do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e do Sistema de Gestão Fundiária (SIGEF), elementos suficientes para configurar a responsabilidade civil objetiva na modalidade propter rem — que independe de culpa e recai sobre o titular do imóvel à época do dano.
Condenação imposta ao réu
O réu foi condenado a apresentar e executar Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00; abster-se de realizar novos desmatamentos na área, sob pena de multa diária de R$ 50.000,00; ter suspenso o Cadastro Ambiental Rural (CAR) da área até aprovação do PRAD;
O réu deve pagar indenização por danos materiais no valor de R$ 913.070,00, com correção desde julho de 2018 e juros desde a citação; oagar indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 45.653,50 (5% do valor do dano material), com os mesmos encargos legais;
Ter seus dados comunicados a instituições públicas e financeiras, para suspensão de benefícios vinculados ao crédito rural, conforme art. 78-A da Lei nº 9.605/98.
Princípios e jurisprudência aplicados
A sentença aplica os princípios do poluidor-pagador, da prevenção, da reparação integral e do in dubio pro natura, além de precedentes relevantes do STJ, como o REsp 1.198.727/MG e o REsp 650.728/SC. A juíza também afastou o princípio da insignificância ambiental, ressaltando que, mesmo de pequena extensão, o desmatamento sem autorização configura ilícito com presunção de dano ambiental.
Processo 1007619-98.2020.4.01.3200