Inexistindo dano ao erário, má-fé ou qualquer elemento subjetivo de desonestidade, a conduta não configura ato de improbidade administrativa.
Foi com esse fundamento que a a Juíza Jaiza Maria Pinto Fraxe, da SJAM, rejeitou os pedidos formulados pelo Ministério Público Federal (MPF) em ação ajuizada contra um servidor público acusado de acúmulo indevido de cargos.
A decisão, que resolve o mérito nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, também afastou a condenação em honorários advocatícios, conforme o art. 23-B, §2º, da Lei de Improbidade Administrativa, e declarou que a sentença não está sujeita a reexame necessário.
A ação foi proposta com base na alegação de que o servidor teria mantido dois vínculos públicos supostamente incompatíveis em razão de regime de dedicação exclusiva, o que configuraria enriquecimento ilícito.
O MPF havia sustentado que o servidor público teria acumulado ilegalmente dois cargos públicos remunerados, o que, segundo a acusação, violaria o art. 37, inciso XVI, da Constituição Federal, que proíbe a acumulação de cargos públicos, salvo nas exceções expressamente previstas e desde que haja compatibilidade de horários. No entender do MPF, não havia compatibilidade entre os vínculos e, além disso, um dos cargos estaria vinculado a regime de dedicação exclusiva, o que por si só impediria o acúmulo.
Com base nisso, o órgão ministerial afirmou que o servidor teria percebido remuneração indevida ao longo dos anos, o que configuraria enriquecimento ilícito, nos termos do art. 9º, caput, da antiga redação da Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa), dispositivo que trata de condutas em que o agente público aufere vantagem patrimonial indevida em razão do exercício do cargo.
No entanto, a sentença reconheceu que, após as alterações introduzidas pela Lei nº 14.230/2021, a responsabilização por improbidade administrativa exige comprovação de dolo específico, o que não se verificou no caso concreto. Com base na nova legislação e em precedentes do Supremo Tribunal Federal — especialmente o julgamento do ARE 843989 —, o juízo federal destacou que a vontade livre e consciente de alcançar resultado ilícito é condição essencial para a configuração do ilícito.
De acordo com a fundamentação, ficou demonstrado que a acumulação envolvia cargos permitidos pela Constituição, desde que houvesse compatibilidade de horários — hipótese que foi considerada viável, conforme pareceres e documentos juntados aos autos. Além disso, a atuação do servidor se deu de forma pública, regular e com conhecimento dos órgãos envolvidos, não havendo qualquer ocultação, abandono de função ou desvio de recursos.
A decisão também apontou que as atividades executadas em ambos os vínculos públicos foram efetivamente desempenhadas, com convênios formais entre as instituições para permitir o exercício conjunto de funções técnicas e acadêmicas. Por essas razões, concluiu-se que a remuneração percebida não caracterizou enriquecimento ilícito, mas sim contraprestação por serviços devidamente prestados, afastando-se a improbidade.
PROCESSO: 1002640-30.2019.4.01.3200