Defensoria do Rio quer fim de Súmula que legitima condenação só com base em palavra de policiais

Defensoria do Rio quer fim de Súmula que legitima condenação só com base em palavra de policiais

Permitir a condenação do réu com base apenas em depoimentos de policiais, como faz a Súmula 70 do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), distorce o processo penal, legitima abusos das forças de segurança e amplia a seletividade do sistema criminal, contribuindo para o encarceramento de negros e pobres.

Em parecer encomendado pelo Centro de Estudos Jurídicos da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, especlialistas opinam pelo cancelamento da norma ou, em caso de sua manutenção, por uma mudança na redação, no sentido de que “é desautorizada a condenação baseada exclusivamente em depoimentos de autoridades policiais e seus agentes”.

Aprovada pelo Órgão Especial do TJ-RJ em 2003, a Súmula 70 tem a seguinte redação: “O fato de restringir-se a prova oral a depoimentos de autoridades policiais e seus agentes não desautoriza a condenação”.

Para os professores  Salo de Carvalho, professor de Direito Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e Mariana de Assis Brasil e Weigert, professora de Criminologia do programa de pós-graduação da Universidade Estácio de Sá eles opinam pelo cancelamento da norma ou, em caso de sua manutenção, por uma mudança na redação, no sentido de que “é desautorizada a condenação baseada exclusivamente em depoimentos de autoridades policiais e seus agentes”. 

Carvalho e Mariana apontam que o depoimento policial é “um dos pilares de sustentação das sentenças criminais condenatórias, especialmente nos delitos patrimoniais e nos ilícitos relacionados com o Direito Penal das drogas”.

Presunção de regularidade
A Súmula 70, destacam eles, baseia-se na presunção de regularidade da atividade policial e das suas manifestações nos procedimentos administrativos e judiciais apuratórios de crimes. “Em razão do cargo, os agentes do Estado estariam resguardados pela fé pública e os seus depoimentos somente poderiam ser refutados se apresentadas provas que evidenciassem má-fé.” Porém, na América Latina, a regra é a violação, por ação ou omissão, da legalidade por parte de agentes dos sistemas punitivos, ressaltam os professores.

A Defensoria Pública do Rio pediu, em 2018, o cancelamento ou, subsidiariamente, a revisão da norma ao Centro de Estudos e Debates do TJ-RJ. O então defensor público-geral do Rio, André Luís Machado de Castro, citou a análise de 1.250 acórdãos publicados entre 2013 e 2016, feita pela Coordenação de Defesa Criminal do órgão. O estudo apontou que magistrados vinham interpretando a Súmula 70 no sentido de presumir a veracidade dos depoimentos de policiais.

O juiz Alberto Fraga também se manifestou pelo cancelamento do verbete, mas sugeriu outra redação em caso de sua manutenção: “Depoimentos de autoridades policiais e seus agentes autorizam a condenação desde que cotejados a outros meios de provas regularmente coligidos aos autos ou desde que demonstrada a impossibilidade de sua produção, ocasião em que se torna ainda mais necessária a detida análise dos depoimentos.”

Por outro lado, os juízes Alberto Salomão Júnior e Bruno Mazza opinaram pela manutenção da Súmula 70. Porém, eles destacaram que os depoimentos de policiais não são inquestionáveis e que é preciso garantir aos réus o contraditório e a ampla defesa.

O processo está com o desembargador Carlos Santos Oliveira. Não há previsão de retomada do julgamento.

Fonte Conjur

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