O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aplicou, por unanimidade e maioria, a pena de aposentadoria compulsória a um magistrado acusado de graves desvios funcionais, entre eles a adoção de postura acusatória, utilização do processo penal como ferramenta de autopromoção e envolvimento em atividade político-partidária.
As decisões foram proferidas nos Processos Administrativos Disciplinares (PADs) nº 0001819-93.2023.2.00.0000, 0001817-26.2023.2.00.0000 e 0001820-78.2023.2.00.0000, conforme divulgado no Informativo CNJ nº 8/2025.
Segundo o Plenário do CNJ, o juiz Marcelo Bretas deixou de observar seu dever constitucional de imparcialidade, agindo de forma parcial ao longo das persecuções penais, assumindo funções típicas da acusação e buscando produzir provas com o objetivo de obter condenações.
Para os conselheiros, tal conduta revelou um comportamento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo, ferindo os deveres previstos no art. 35, I e VIII, da Lei Orgânica da Magistratura (Loman), além de diversos dispositivos do Código de Ética da Magistratura Nacional.
De acordo com os autos, o magistrado utilizava sua posição para direcionar investigações e colheita de provas contra investigados e denunciados, desrespeitando garantias fundamentais, como o devido processo legal, a presunção de inocência e o princípio do juiz natural. As decisões de busca e apreensão proferidas pelo juiz também foram apontadas como genéricas e desproporcionais, afetando inclusive profissionais da advocacia sem a devida delimitação e respeito às prerrogativas da classe.
O CNJ enfatizou que o juiz não pode participar de tratativas de delação premiada (art. 4º, §6º, da Lei 12.850/2013), justamente para preservar o modelo acusatório, no qual as funções de acusar, defender e julgar devem permanecer claramente separadas. A tentativa de conduzir investigações sob o pretexto de combate à corrupção foi classificada como “fishing expedition” – expressão que designa a busca indiscriminada por provas após a definição prévia de alvos, prática vedada no sistema penal.
O comportamento do juiz também foi qualificado como politicamente motivado, violando o art. 95, parágrafo único, III, da Constituição Federal, que proíbe juízes de exercerem atividade político-partidária. Parte dos processos revelou que o magistrado se envolveu em declarações públicas e decisões com finalidade de influenciar eleições e sustentar convicções políticas pessoais.
Nos PADs julgados por unanimidade, o CNJ aplicou a aposentadoria compulsória com fundamento nos artigos 42, V, da Loman e 7º da Resolução CNJ nº 135/2011. No terceiro processo, a pena foi imposta por maioria, com vencimento dos Conselheiros Pablo Coutinho Barreto e João Paulo Schoucair, que entenderam pela improcedência de parte das imputações. A Conselheira Mônica Nobre declarou-se impedida nesse julgamento.
Considerando a gravidade dos fatos e o envolvimento de outros agentes públicos, o CNJ determinou o envio de cópias dos autos ao Ministério Público Federal e à Advocacia-Geral da União para eventual propositura de ação de improbidade administrativa e medidas sobre perda do cargo. Também foram expedidos ofícios à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para ciência e apuração quanto à atuação de advogado e procurador regional da República que teriam colaborado com as condutas investigadas.
A decisão reforça o entendimento do CNJ de que a independência funcional do magistrado não autoriza desvios de finalidade, violações processuais ou utilização da toga para fins pessoais, midiáticos ou político-partidários.
PADs 0001819-93.2023.2.00.0000 e 0001817-26.2023.2.00.0000