A escolha de foro aleatório, sem qualquer vínculo com as partes ou com o contrato discutido, foi considerada prática abusiva do autor pela 19ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que manteve decisão de primeira instância e determinou a remessa de ação indenizatória ajuizada contra a Gol Linhas Aéreas para o foro competente.
A decisão tem como fundamento a Lei nº 14.879/2024 onde se prevê que a eleição de foro deve guardar pertinência com o domicílio das partes ou com o local da obrigação e que o ajuizamento de ação em juízo aleatório constitui prática abusiva, passível de declinação de competência de ofício.
A autora, domiciliada em Manaus (AM), ajuizou a ação de indenização por danos morais no Foro Regional do Jabaquara, na capital paulista, contra a companhia aérea sediada no Rio de Janeiro (RJ). A juíza de origem, Michelle Fabiola Dittert Pupulim, reconheceu de ofício a incompetência territorial e determinou que a parte indicasse, no prazo de 15 dias, se pretendia prosseguir com a ação em seu domicílio (Manaus) ou no domicílio da ré (Rio de Janeiro).
A consumidora interpôs agravo de instrumento, alegando que, como a ré possui filiais em todo o país, inclusive em São Paulo, seria legítima a escolha do foro. Também invocou a Súmula 33 do STJ, segundo a qual a incompetência relativa não pode ser reconhecida de ofício.
O Desembargador relator, João Camillo de Almeida Prado Costa, rejeitou os argumentos. Em seu voto, destacou que o ajuizamento da ação em local sem qualquer vínculo com as partes ou com o negócio jurídico caracteriza a prática processual abusiva vedada pela nova legislação. Definiu que o juiz tem o poder-dever de zelar pela correta prestação jurisdicional, impedindo a escolha aleatória de foro, malferindo o princípio do juiz natural.
“O ajuizamento de ação em juízo aleatório, entendido como aquele sem vinculação com o domicílio ou a residência das partes ou com o negócio jurídico discutido na demanda, constitui prática abusiva que justifica a declinação de competência de ofício.”
Para o relator, o caso não envolve mera incompetência relativa, mas tentativa de manipulação do juízo natural, o que compromete a boa-fé objetiva e a organização judiciária. A decisão reforça entendimento jurisprudencial que busca coibir o chamado “foro de conveniência”, comum em litígios massificados ou de caráter predatório.
Foram citados precedentes do TJSP em que o ajuizamento artificial em comarcas aleatórias motivou a extinção do processo ou o reconhecimento de incompetência de ofício — mesmo antes da vigência da Lei nº 14.879/2024, que reforçou tal entendimento.
Ao final, a Turma julgadora confirmou a decisão que condiciona o prosseguimento do feito à opção da autora entre os foros de Manaus (seu domicílio) ou do Rio de Janeiro (domicílio da ré), sendo vedada a continuidade da ação na comarca de São Paulo.
Número do processo: Agravo de Instrumento n. 2037965-07.2025.8.26.0000
Relator: Des. João Camillo de Almeida Prado Costa
Comarca de origem: Foro Regional do Jabaquara – SP