Após o Supremo Tribunal Federal (STF) afirmar que a aposentadoria não impede a instauração de processo administrativo disciplinar (PAD) por atos praticados na atividade funcional, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) decidiu, por unanimidade, prorrogar por mais 180 dias o PAD instaurado contra o promotor de Justiça aposentado Walber Luís Silva do Nascimento, do Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM).
A decisão foi tomada na sessão do dia 24 de julho, a partir de proposta do conselheiro relator Antônio Edílio Magalhães Teixeira.
No julgamento do Mandado de Segurança nº 40109/DF, o STF reafirmou que o CNMP pode exercer sua competência originária — prevista no art. 74 de seu Regimento Interno — para instaurar PAD contra membros já aposentados, desde que os fatos tenham sido praticados durante o exercício do cargo e haja sanção disciplinar compatível com a nova condição funcional, como a conversão da pena de suspensão em multa (art. 134 da LOMP/AM).
A Segunda Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso interposto por Walber, que alegava prescrição, violação à coisa julgada e ausência de competência do CNMP.
O STF considerou, ainda, que o arquivamento anterior de sindicância pela Corregedoria-Geral do MPAM — motivado exclusivamente pela aposentadoria do promotor — não representou julgamento de mérito, nem impediu nova apuração por órgão com competência própria. Assim, a Corte afastou qualquer ilegalidade na continuidade do PAD, reforçando que a responsabilidade disciplinar pode subsistir mesmo após a inatividade do membro.
Prorrogação do PAD no CNMP
Com a segurança negada pelo STF, o CNMP deu continuidade à apuração disciplinar e, diante da não conclusão da fase instrutória — paralisada por recurso ainda pendente —, prorrogou o prazo de investigação por mais seis meses. O novo prazo passou a contar a partir de 10 de junho de 2025, data em que se encerrava o período originalmente fixado.
O PAD foi instaurado em dezembro de 2023 com base em reclamação disciplinar que relatou declarações proferidas por Walber durante sessão do Tribunal do Júri em Manaus, no dia 19 de junho de 2023. Na ocasião, ele se referiu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva como “bandido” e “líder da quadrilha dos ladrões”, e acusou ministros dos tribunais superiores de atuarem em favor do Partido dos Trabalhadores, ao dizer que “vários Ministros dos Tribunais Superiores, a serviço dessa quadrilha chamada Partido dos Trabalhadores, soltaram todos eles”.
Segundo a Corregedoria Nacional do MP, tais manifestações violaram os deveres funcionais previstos no art. 118, incisos I, II e VIII, da Lei Complementar nº 11/1993, que impõem aos membros do Ministério Público a obrigação de manter conduta ilibada, zelar pelo prestígio dos Poderes constituídos, da instituição e de seus membros, além de desempenhar com zelo e urbanidade suas funções.
Ao votar pela instauração do PAD, o então corregedor Ângelo Fabiano Farias da Costa considerou que as falas extrapolaram os limites da liberdade de expressão e atingiram a dignidade do cargo, comprometendo a imagem institucional do Ministério Público.
Responsabilização administrativa e independência das instâncias
A decisão do STF destacou o princípio da independência das instâncias, afirmando que a eventual imunidade penal não impede a apuração disciplinar de condutas incompatíveis com os deveres funcionais. Também ressaltou que, conforme o art. 105 do Regimento Interno do CNMP, aplica-se subsidiariamente a Lei nº 8.112/1990 aos processos disciplinares no órgão, inclusive quanto à contagem de prazos prescricionais quando a infração também for tipificada como crime.
Paralelamente ao PAD, o CNMP encaminhou os autos ao Ministério Público Federal no Estado do Amazonas para análise da possível prática do crime previsto no art. 286 do Código Penal (incitação ao crime), em razão das falas proferidas em sessão pública.
Com a prorrogação da instrução, o processo disciplinar deve seguir em tramitação até dezembro de 2025, podendo ao final resultar em sanção compatível com a aposentadoria, caso confirmada a infração disciplinar.
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