O rompimento unilateral de ajuste informal firmado entre consumidor e concessionária de energia, quanto à forma de aferição do consumo elétrico, aliado à emissão de fatura desproporcional e sem justificativa técnica, caracteriza prática abusiva e gera dever de indenizar por dano moral, definiu o Juiz Luís Carlos Honório de Valois Coelho.
Sentença da 9ª Vara Cível de Manaus julgou procedente a ação movida por consumidora rural contra a Amazonas Energia, declarando a inexistência de débito no valor de R$ 10.034,89, relativo à fatura emitida indevidamente, e condenando a concessionária ao pagamento de R$ 2 mil por danos morais.
De acordo com os autos, a autora reside em sítio cercado por razões de segurança, dificultando o acesso ao medidor de energia. Diante disso, foi estabelecido acordo tácito com a concessionária para envio mensal de fotografias do aparelho, método aceito por longo período pela empresa como forma legítima de leitura do consumo.
Sem qualquer aviso prévio, a concessionária deixou de considerar as imagens enviadas, passou a emitir faturas por média, e depois surpreendeu a consumidora com cobrança abrupta de mais de R$ 10 mil — valor completamente destoante do consumo histórico da unidade, descrita nos autos como pouco frequentada, com uso restrito a uma geladeira pequena e iluminação noturna automatizada.
A empresa, mesmo citada, não apresentou contestação, tendo sido decretada sua revelia. Alegou apenas, informalmente, que a leitura presencial teria sido realizada por funcionário que adentrou o imóvel rural através de uma suposta falha na cerca — sem, contudo, comprovar o acesso ou o consumo apontado.
Na sentença, o juiz Luís Carlos Honório de Valois Coêlho ressaltou a ausência de contraditório, a ruptura imotivada do ajuste de convivência entre as partes e a total desproporcionalidade da fatura emitida. Para o magistrado, a conduta da empresa violou os deveres de boa-fé objetiva e transparência, previstos no Código de Defesa do Consumidor.
“A súbita emissão de fatura no valor de R$ 10.034,89, dissociada do histórico de consumo, carece de motivação plausível”, pontuou, ao destacar a ausência de justificativa técnica e o risco de desequilíbrio contratual.
O juiz reconheceu o dano moral in re ipsa, decorrente da insegurança e angústia causadas pela cobrança inesperada, em linha com a jurisprudência do STJ, que admite a reparação nesses casos ainda que não ocorra interrupção no fornecimento (REsp 1.658.429/SP).
A sentença fixou a indenização por dano moral em R$ 2 mil, com atualização monetária pelo INPC e juros legais desde a citação, além da condenação da empresa ao pagamento de custas e honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação.
A decisão reafirma que acordos informais, quando reiterados e aceitos pelas partes, integram a moldura contratual e não podem ser ignorados de forma unilateral, sob pena de abuso e responsabilização civil.
Processo nº 0635507-79.2023.8.04.0001