Consulta prévia é condição de validade para obras que impactem povos indígenas, reafirma Ministério Público Federal ao TRF1. A ausência desse procedimento em projeto da BR-319 viola Convenção 169 da OIT e jurisprudência do STF, TRF1 e Corte Interamericana, defende o MPF em oposição a recurso do DNIT contra a suspensão das obras.
A consulta prévia, livre e informada é direito fundamental dos povos indígenas e comunidades tradicionais e constitui condição de validade para qualquer empreendimento que afete seus territórios ou modos de vida.
O Ministério Público Federal (MPF) reforçou essa exigência em parecer no qual aponta a nulidade da Licença Prévia (LP) concedida no contexto das obras da rodovia BR-319, diante da ausência de consulta às comunidades afetadas, conforme determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil.
De acordo com o MPF, embora tenham sido realizadas audiências públicas e apresentado Estudo do Componente Indígena (ECI), tais medidas não se confundem com o procedimento de consulta prévia, que deve ocorrer em momento anterior às decisões administrativas, respeitando os protocolos próprios de decisão das comunidades envolvidas.
O documento, assinado pelo Procurador Regional da República Gustavo Pessanha Velloso, sustenta que “a consulta não pode ser uma escuta meramente simbólica” e deve garantir o exercício efetivo da autodeterminação dos povos tradicionais.
O entendimento está alinhado à jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (caso Povo Sarayaku vs. Equador), que fixou a obrigatoriedade de consulta desde as primeiras fases de planejamento de qualquer medida que possa afetar povos indígenas. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADPF 709 e do RE 1.379.751/PA (caso Belo Monte), também reconheceu a imprescindibilidade da participação dessas comunidades antes da concessão de licenças ou autorizações, defende o MPF.
De acordo com o MPF, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) tem jurisprudência consolidada sobre o tema, declarando ilegítimos atos administrativos e projetos que desconsiderem o dever de consulta. Em diversos precedentes, cita o órgão,como o relativo à instalação do Polo Naval em Manaus e à exploração mineral em terras indígenas, a Corte reconheceu que a ausência de consulta infringe normas constitucionais e internacionais.
Segundo o MPF, os impactos sociais, ambientais e territoriais decorrentes do simples anúncio de um empreendimento na Amazônia já justificam a consulta prévia como instrumento jurídico de proteção dos direitos fundamentais dessas populações. O não cumprimento desse dever, além de gerar nulidades administrativas, pode acarretar responsabilidade internacional ao Estado brasileiro, aponta o parecer. O recurso do DNIT ainda será examinado pelo TRF1.