A obrigação do Estado e das operadoras de assegurar o direito fundamental à saúde, mesmo diante de controvérsias científicas sobre a eficácia de determinados tratamentos, foi o eixo de decisão proferida pela 1ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho de Manaus.
O juízo reconheceu o dever da Hapvida Assistência Médica de fornecer a escetamina intranasal (Spravato), medicamento registrado pela ANVISA e prescrito por médica assistente a paciente com transtorno depressivo maior resistente a tratamento. Além disso, a operadora foi condenada a custear internação hospitalar e acompanhamento clínico e a pagar indenização de R$ 10 mil por danos morais, em razão do descumprimento de ordem liminar anteriormente deferida.
Fundamentação
Embora o parecer técnico do e-NatJus Nacional tenha destacado a ausência de evidência robusta de superioridade da escetamina frente a outras terapias já previstas em diretrizes internacionais (APA, NICE) e nacionais, o magistrado enfatizou que tais manifestações possuem caráter opinativo e não vinculam a jurisdição.
Com base no Tema 106 do STJ (REsp 1.657.156/RJ), o juiz Cid da Veiga Soares Junior destacou que o medicamento possui registro sanitário no país e que o relatório médico atesta tanto a necessidade quanto a ineficácia das alternativas convencionais já utilizadas. Assim, estavam presentes os requisitos que legitimam a intervenção judicial.
O magistrado salientou que a negativa de cobertura, sob justificativa de ausência em protocolos do SUS, afronta os arts. 6º e 196 da Constituição, que consagram o direito à saúde, em conexão com a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88).
Danos morais e execução
O descumprimento da ordem liminar, que deveria assegurar tratamento imediato diante do risco de agravamento clínico e ideação suicida, foi considerado conduta ilícita suficiente para gerar reparação extrapatrimonial.
A indenização foi arbitrada em R$ 10 mil, com incidência de juros moratórios pela taxa SELIC e correção monetária pelo IPCA, conforme a Súmula 362 do STJ.
Para garantir a efetividade da medida, foi fixada multa diária de R$ 500, limitada a 15 dias-multa, em caso de descumprimento do fornecimento do medicamento e da internação. O juiz também reduziu o bloqueio judicial de valores para R$ 50 mil, reputando excessivo o montante anterior diante do objeto da demanda.
A sentença julgou procedentes os pedidos do autor, confirmando a tutela provisória e condenando a Hapvida a: Fornecer o medicamento Spravato conforme prescrição médica; autorizar e custear a internação hospitalar e acompanhamento clínico necessário; pagar indenização de R$ 10 mil por danos morais; arcar com custas processuais e honorários de 10% sobre o valor da condenação.
Autos nº: 0560285-71.2024.8.04.0001