Para a Advocacia-Geral da União (AGU), que representa a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), o Poder Judiciário tem extrapolado suas competências constitucionais ao autorizar, de forma reiterada, o reconhecimento da regularidade de uma concessionária inadimplente com obrigações setoriais, o que afronta o tratamento isonômico a ser dispensado às demais concessionárias.
A crítica foi formalizada em novo agravo de instrumento apresentado ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), no qual a autarquia busca reverter decisão da 1ª Vara Federal Cível de Manaus que prorrogou, por prazo indeterminado, a validade da certidão de regularidade da empresa Amazonas Distribuidora de Energia S/A.
Segundo a Procuradoria Federal, ao garantir a emissão da certidão positiva com efeitos de negativa, mesmo diante de dívida confessada superior a R$ 4,7 bilhões, a decisão judicial compromete a segurança jurídica, o equilíbrio econômico-financeiro do setor elétrico nacional e o princípio da isonomia entre os agentes regulados.
A ANEEL sustenta que tal postura ignora a legislação específica que veda a concessão de benefícios tarifários e o repasse de recursos públicos a concessionárias inadimplentes.
O caso teve início com o ajuizamento de mandado de segurança pela Amazonas Energia, que alegou risco de colapso financeiro e de interrupção do serviço no estado caso fosse inscrita no cadastro de inadimplentes do setor elétrico.
Em decisões liminares sucessivas, o Juízo Federal autorizou a prorrogação da certidão de regularidade, garantindo à empresa o acesso a repasses dos fundos setoriais — como a Conta de Consumo de Combustível (CCC), a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e a Reserva Global de Reversão (RGR) — além da aplicação do reajuste tarifário autorizado pela própria ANEEL.
Contudo, a agência reguladora afirma que a medida viola normas como o Decreto-Lei nº 2.432/1988, a Lei nº 8.631/1993, o Decreto nº 774/1993 e a Resolução Normativa ANEEL nº 917/2021, que exigem adimplência para a emissão da certidão. Alega ainda que a insistência do Judiciário em prorrogar os efeitos da certidão “sine die” configura verdadeira usurpação das atribuições do Poder Concedente e da ANEEL, responsáveis legais pela fiscalização, gestão e eventual renovação ou extinção das concessões de serviço público.
No recurso, a ANEEL também denuncia a existência de débitos novos da Amazonas Energia — já reconhecidos em outro processo — e alerta para o risco de que decisões judiciais paralelas gerem efeitos contraditórios. Por isso, pede a concessão imediata de efeito suspensivo para suspender os efeitos da decisão agravada ou, ao menos, limitar sua eficácia aos débitos constituídos até novembro de 2022.
Ao final, a autarquia requer a cassação definitiva da decisão e reafirma que permitir a continuidade de benefícios a uma empresa inadimplente representa “um estímulo ao descumprimento de obrigações financeiras que ameaça a cadeia econômica do setor elétrico como um todo”.