A cobrança de tarifas de água em valores desproporcionais, sem correspondência com o consumo real e sem a devida comprovação técnica, caracteriza falha na prestação do serviço e impõe ao fornecedor o dever de indenizar o consumidor. Foi o que decidiu a 22ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho de Manaus, em sentença que determinou a revisão das faturas questionadas e fixou reparação por danos morais em R$ 2 mil.
O caso em exame
A consumidora, moradora do bairro Monte das Oliveiras, vinha pagando faturas mensais em torno de R$ 60,00. A partir de março de 2024, passou a receber cobranças muito superiores, chegando a R$ 587,73 em agosto do mesmo ano, acumulando dívida de mais de R$ 5 mil. Mesmo tendo solicitado inspeção do hidrômetro e revisão das contas, não obteve solução da concessionária, que manteve a ameaça de corte e a possibilidade de negativação do nome.
Diante da recusa administrativa, a usuária ingressou com ação judicial pedindo revisão das tarifas, tutela de urgência para impedir suspensão do fornecimento e indenização pelos danos morais sofridos.
Questão em discussão
A controvérsia girou em torno da validade das cobranças realizadas pela concessionária e da responsabilidade civil pela majoração injustificada das tarifas. A concessionária alegava regularidade da medição, mas a prova documental apresentada pela autora evidenciava discrepâncias entre o consumo anterior e posterior à troca do hidrômetro.
Razões de decidir
O juiz George Hamilton Lins Barroso reconheceu a incidência do Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova em favor da parte vulnerável, mas ressaltou que a própria consumidora apresentou documentos suficientes para demonstrar a desproporção.
Sem possibilidade de perícia no medidor — já substituído —, prevaleceu o princípio do in dubio pro consumidor. Para o magistrado, a imposição de cobranças tão elevadas, sem respaldo técnico, viola os princípios da boa-fé e da proporcionalidade e se enquadra como cláusula abusiva nos termos do art. 51, IV, do CDC.
O julgador também considerou configurado o dano moral, por entender que a consumidora sofreu constrangimentos que extrapolam o mero aborrecimento, especialmente diante da ameaça de corte de um serviço essencial. O valor fixado em R$ 2 mil observou critérios de razoabilidade, capacidade econômica da ré e caráter pedagógico da indenização, sem implicar enriquecimento indevido.
Dispositivo e tese
A sentença julgou parcialmente procedentes os pedidos para: Determinar a revisão das faturas objeto da lide, afastando os valores excessivos; Condenar a concessionária ao pagamento de R$ 2 mil por danos morais, corrigidos pelo IPCA e acrescidos de juros pela Selic; Fixar custas processuais e honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação, a cargo da requerida.
A decisão reafirma que cobranças de tarifas sem respaldo em consumo efetivo configuram vício de serviço e sujeitam o fornecedor à responsabilização civil, em consonância com os artigos 186 e 927 do Código Civil e com a proteção especial assegurada ao consumidor pelo CDC.
Autos nº: 0551331-36.2024.8.04.0001