Mesmo ao exercer regularmente o direito à rescisão unilateral de plano de saúde coletivo, a operadora deve assegurar a continuidade dos serviços para os usuários que estiverem em tratamentos médicos necessários para a manutenção de sua segurança física, o que inclui mulheres em gestações de risco.
Com esse entendimento, a 1ª Vara de Guararapes (SP) anulou o cancelamento do plano de saúde de uma mulher grávida, determinou a manutenção do mesmo, nas mesmas condições de cobertura e preço, por pelo menos seis meses após o parto e condenou as empresas responsáveis ao pagamento de indenização por dano moral no valor de R$ 5 mil.
O juízo decidiu ao analisar uma ação de nulidade de cancelamento combinada com obrigação de fazer e pedido de indenização da gestante contra a operadora do plano e a empresa responsável pela assistência médica.
Segundo os autos, a usuária aderiu ao plano de saúde coletivo fornecido por seu empregador em dezembro de 2023. O contrato foi cancelado unilateralmente pela operadora em 28 de fevereiro de 2025.
A autora provou que foi notificada apenas no dia 13 daquele mês. À época, estava grávida de 20 semanas, em gestação considerada de alto risco. Alegou que o cancelamento, que considerou abrupto, afetaria a continuidade do tratamento pré-natal e o planejamento do parto.
As rés defenderam a legalidade da rescisão unilateral do contrato coletivo e alegaram que o direito da autora se limitaria à portabilidade de carências, que foi ofertada.
Em sua decisão, o juiz Fernando Henrique Custódio de Deus observou que o tempo entre a notificação do cancelamento e a suspensão dos serviços não obedeceu ao prazo mínimo de 30 dias. Independentemente disso, porém, apontou violação ao entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema Repetitivo 1.082.
A tese em questão determina que a operadora, mesmo ao exercer regularmente o direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deve “assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida”.
“A situação da Autora, com uma gestação de alto risco, devidamente comprovada pelos relatórios médicos acostados inequivocamente se amolda à hipótese de ‘pleno tratamento médico garantidor de sua incolumidade física’. A interrupção da assistência médica neste cenário colocaria em risco a saúde e a integridade física da gestante e do feto. Não se trata de mera gestação fisiológica, mas de quadro que exige acompanhamento médico especializado e contínuo, conforme fartamente documentado”, escreveu o julgador.
“A oferta de portabilidade de carências, embora seja um direito do beneficiário, não se mostra, no caso concreto, suficiente para afastar o dever de continuidade do tratamento, nos moldes do Tema 1.082. A migração para um novo plano, mesmo sem carências, poderia implicar em alteração de rede credenciada, diferentes condições contratuais e, principalmente, a interrupção da assistência com os profissionais que já acompanham a gestação de risco, gerando insegurança e potenciais prejuízos à saúde da Autora e do nascituro em um momento crítico.”
Processo 1000500-06.2025.8.26.0218
Com informações do Conjur