Presidente do STF destaca avanços civilizatórios nos 36 anos da Constituição

Presidente do STF destaca avanços civilizatórios nos 36 anos da Constituição

A Constituição brasileira de 1988 chega aos 36 anos com as marcas e cicatrizes da maturidade. Tem servido bem ao país em tempos que não foram banais. Vivemos épocas de bonança econômica e de recessão. Tivemos governos mais à esquerda e mais à direita. Escândalos de corrupção se multiplicaram. Uma pandemia, gerida de maneira desastrosa, levou à morte 700 mil brasileiros. Houve dois impeachments de presidentes, bem como ameaças de golpe de Estado e os devastadores ataques do 8 de Janeiro.

Apesar de sustos, sobressaltos e vícios persistentes, há realizações importantes a celebrar. A primeira delas é o mais longo período de estabilidade institucional da fase republicana. Não custa relembrar que a História do Brasil foi marcada por sucessivas quebras da legalidade constitucional. Da Revolução de 1930 ao golpe de 1964, do Estado Novo ao AI nº 5, do impedimento à posse de Pedro Aleixo ao Pacote de Abril de 1977, foram repetidas as crises e soluções autoritárias. Apesar de alguma apreensão recente, superamos os ciclos do atraso. Aprendemos que, apesar de tudo, é bom viver numa democracia. Só quem não soube a sombra não reconhece a luz.

Também devemos celebrar a conquista de estabilidade monetária. Os mais antigos viveram os dias aflitos da inflação descontrolada e dos planos econômicos fracassados. Um contexto econômico que penalizava os mais pobres, aumentando o abismo social. Neste ano em que o Real completa 30 anos, vale enfatizar que a desvalorização da moeda e o endividamento descontrolado atingem, antes e acima de tudo, os que não têm como se proteger no mercado financeiro.

Na cota dos avanços civilizatórios, há conquistas importantes a celebrar. As mulheres assumiram novo papel na família, na sociedade e no mercado de trabalho. A comunidade LGBT teve reconhecido o direito às uniões homoafetivas e ao casamento. Os povos indígenas tiveram algumas de suas terras demarcadas. Afrodescendentes foram beneficiados por programas de ação afirmativa e pelo reconhecimento tardio de que existe, entre nós, um racismo estrutural a derrotar. Pessoas com deficiência viram aumentar a consciência acerca da acessibilidade e do capacitismo. Não são lutas acabadas, mas na vida é preciso celebrar as vitórias do caminho.

O Supremo Tribunal Federal (STF), no arranjo institucional brasileiro, desempenha um papel diferenciado, de maior protagonismo, em contraste com Cortes pelo mundo afora. As razões são fáceis de demonstrar. A Constituição brasileira traz para o campo do Direito muitos temas que, noutros países, são deixados para a política e para a legislação ordinária. Além disso, inúmeras ações diretas podem ser propostas perante o Supremo por centenas de atores institucionais e privados. Esse fato permite que quase qualquer questão de mínima relevância no país seja levada ao Tribunal. Some-se a isso uma larga competência criminal que atrai o julgamento de parlamentares e autoridades do primeiro escalão e, por fim, a transmissão dos julgamentos pela televisão.

Nesse contexto, o STF decide as questões mais divisivas da sociedade brasileira. Muito pouco há de ativismo. O Tribunal aplica uma Constituição abrangente. E julga muitos casos controvertidos e importantes: da união entre pessoas do mesmo sexo à definição da quantidade de droga que distingue usuário de traficante; da proibição do nepotismo à garantia de mínimas condições de humanidade nos presídios. São questões polêmicas, em que pessoas esclarecidas e bem-intencionadas pensam de maneira diferente e vocalizam seu descontentamento. As críticas e insatisfações são, portanto, inevitáveis.

O STF tem como principal missão ser o guardião da Constituição. Isso significa assegurar o governo da maioria, preservar o Estado de Direito e proteger os direitos fundamentais. Em meio a muitas incompreensões e inevitáveis imperfeições humanas, tem sido uma missão bem cumprida. Sem unanimidades, naturalmente, porque pensamento único só há em ditaduras.

*Ministro Luís Roberto Barroso é presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça.

Com informações do STF

Leia mais

Fraude na venda do imóvel não pode ser suportada pelo comprador, ainda que sem culpa da construtora

No âmbito do direito imobiliário, a responsabilidade civil objetiva e solidária do fornecedor impõe-se quando a fraude é praticada por corretor vinculado à cadeia...

Consumidora derruba imputação de fraude em hidrômetro e será indenizada por Águas de Manaus

Sentença da 1ª Vara Cível de Manaus julgou procedente ação ajuizada por uma consumidora do Amazonas contra a concessionária Águas de Manaus,  declarando a...

Mais Lidas

Justiça do Amazonas garante o direito de mulher permanecer com o nome de casada após divórcio

O desembargador Flávio Humberto Pascarelli, da 3ª Câmara Cível...

Bemol é condenada por venda de mercadoria com vícios ocultos em Manaus

O Juiz George Hamilton Lins Barroso, da 22ª Vara...

Destaques

Últimas

Indenização legal por encerramento de contrato pode beneficiar pessoa jurídica prestadora de serviço

​Ao prover recurso especial, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que a indenização prevista no...

Audiência na Câmara tem críticas à atuação da ministra Marina Silva

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, participou, no dia 02 de julho, de audiência...

Governo busca pacificação institucional e reabertura de diálogo com Congresso

Em resposta à crescente crise institucional entre os Poderes da República, o governo federal intensificou, nos últimos dias, esforços...

Com Judiciário em recesso e prazos suspensos até o fim de julho, só decisões urgentes serão analisadas

O Judiciário brasileiro entrou oficialmente em recesso na quarta-feira, 2 de julho de 2025. Com isso, todos os prazos...