A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Amazonas decidiu que a liberdade das instituições financeiras para fixar juros não é absoluta e deve ser exercida dentro dos limites da boa-fé e da razoabilidade. A decisão é relatada pela Desembargador Nélia Caminha Jorge, do TJAM.
A decisão reformou parcialmente sentença de primeiro grau para afastar indenização por danos morais e determinar a restituição simples — e não em dobro — dos valores pagos a maior, mas manteve a revisão do contrato de empréstimo celebrado com a Crefisa S.A., reconhecendo a abusividade da taxa de 22% ao mês (987,22% ao ano), mais de três vezes superior à média de mercado apurada pelo Banco Central (6,10% a.m.).
A relatora destacou que a liberdade de estipular juros não pode converter-se em salvo-conduto para práticas abusivas e que o poder de contratar deve observar os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual, especialmente nas relações de consumo. “A inexistência de limitação legal específica não concede às instituições financeiras liberdade absoluta para estipulação de encargos, sob pena de afronta ao equilíbrio contratual”, afirmou.
Segundo o acórdão, a taxa cobrada pela instituição excede, de forma desproporcional, a média do mercado e configura onerosidade excessiva, o que legitima a intervenção judicial para restabelecer o equilíbrio econômico do contrato. A decisão cita os precedentes do STJ (REsp 1.061.530/RS e REsp 1.112.880/PR), que admitem a revisão de juros apenas quando comprovada a abusividade em relação às taxas médias divulgadas pelo Banco Central.
A relatora também aplicou o entendimento da Corte Especial do STJ (EAREsp 676.608/RS), que modulou os efeitos da restituição em dobro para cobranças indevidas efetuadas apenas após março de 2021. Como os pagamentos questionados foram feitos entre janeiro e dezembro de 2020, determinou-se a restituição simples dos valores.
Por outro lado, o Tribunal afastou a condenação por danos morais, entendendo que a cobrança de juros abusivos, por si só, não configura violação a direitos da personalidade, pois não houve demonstração de humilhação, ameaça à subsistência ou abalo psíquico relevante.
Com o resultado, o recurso da Crefisa foi parcialmente provido: o contrato foi revisto, mas sem condenação moral e com devolução simples. A decisão reafirma que a autonomia contratual é um direito relativo, e que a intervenção judicial — quando exercida de forma proporcional — serve à proteção do consumidor e à preservação da função social do contrato.
Recurso n.: 0561230-92.2023.8.04.0001



