A 1ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Amazonas determinou a manutenção definitiva do tratamento médico domiciliar integral (home care 24h) para uma idosa beneficiária do Fundo de Saúde do Exército (FUSEX), afastando critérios administrativos internos utilizados para restringir o atendimento e condenando a União Federal ao pagamento de indenização por danos morais.
A sentença reconheceu que a interrupção do serviço, promovida com base em avaliação administrativa padronizada, desconsiderou a real condição clínica da paciente, colocando sua vida em risco e violando o direito fundamental à saúde e o princípio da dignidade da pessoa humana.
O caso concreto
A autora, senhora idosa e totalmente dependente de terceiros, foi diagnosticada com doença em estágio avançado, demência frontotemporal, tetraplegia espástica, disfagia grave e outras comorbidades, exigindo cuidados técnicos contínuos, aspiração frequente de secreções e risco elevado de asfixia e óbito.
Apesar desse quadro, o FUSEX suspendeu o home care integral, alegando que a paciente não atingia a pontuação mínima prevista em tabela interna de avaliação funcional, substituindo a internação domiciliar hospitalar por modelo assistencial reduzido.
Diante da interrupção, o Juízo concedeu tutela de urgência, determinando o restabelecimento imediato do atendimento 24 horas, e, simultaneamente, determinou a realização de perícia médica judicial domiciliar, para afastar qualquer dúvida técnica.
Perícia judicial prevalece sobre avaliação administrativa
O laudo pericial judicial foi categórico ao afirmar que a paciente necessita de internação domiciliar integral, destacando que seus cuidados não podem ser supridos por cuidadores leigos e exigem equipe técnica especializada de forma contínua.
Em resposta direta a quesito formulado pela União, a perita concluiu expressamente: “A paciente necessita, no momento, de internação domiciliar de 24 horas.” Com base nisso, a sentença ressaltou que critérios administrativos padronizados não podem se sobrepor à prova técnica produzida sob o crivo do contraditório, sobretudo quando se trata de tratamento vital.
O Juízo também destacou que a intervenção judicial não violou a discricionariedade administrativa, mas corrigiu um ato ilegal, uma vez que a Administração ignorou o risco concreto à vida da paciente ao aplicar parâmetros abstratos e descontextualizados da realidade clínica.
Obrigação de custeio integral do tratamento
A decisão determinou que a União mantenha o home care integral sem limitação temporal, enquanto persistirem as condições clínicas, incluindo: equipe multidisciplinar completa; fornecimento contínuo de equipamentos médicos; alimentação enteral, insumos, medicamentos e todo material necessário à substituição da internação hospitalar. Segundo a sentença, o tratamento domiciliar não pode ser fragmentado, pois constitui modalidade substitutiva da internação hospitalar, devendo preservar o mesmo nível de segurança e assistência.
Danos morais reconhecidos
Além da obrigação de fazer, o Juízo reconheceu a ocorrência de dano moral in re ipsa, em razão da interrupção abusiva de tratamento vital e da tentativa de retirada de equipamentos essenciais, como oxigênio e aspirador de secreções. A sentença apontou que a conduta administrativa foi desproporcional, insensível e incompatível com a gravidade do quadro clínico, impondo sofrimento psíquico à paciente e aos familiares.
A União foi condenada ao pagamento de R$ 50 mil a título de indenização por danos morais, valor considerado adequado para cumprir função compensatória e pedagógica, diante da gravidade da violação e do risco concreto à vida da autora.
Processo 1035750-44.2024.4.01.3200



