A prerrogativa do Senado de examinar e aprovar ministros do Supremo Tribunal Federal não se limita ao voto final. Ela engloba o controle do tempo, da agenda e da liturgia procedimental prevista no Regimento Interno, que exige mensagem presidencial acompanhada de documentação completa como condição para a deflagração do processo. Quando esse requisito não é observado, abrem-se margens de tensão entre Poderes — e disputas por quem dita o ritmo da escolha.
Foi nesse terreno que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), decidiu recuar da data que havia anunciado para a sabatina de Jorge Messias, indicado por Lula para o Supremo. A retirada do cronograma, anunciada após dias de ruído entre o Planalto e a cúpula da Casa, foi interpretada como um movimento para retomar o controle institucional da indicação.
A tentativa inicial e o recuo estratégico
Até a última semana, Alcolumbre testava a hipótese de avançar com a sabatina mesmo sem receber a documentação oficial do governo — algo que se chocava com o procedimento formal, que exige mensagem presidencial, currículo e informações completas sobre o indicado. Sem apoio suficiente dentro da Casa, o presidente do Senado abandonou a ideia.
O gesto também dissolveu o cálculo que vinha se formando no Planalto: com uma data já anunciada e a papelada pendente, Lula poderia, caso percebesse clima hostil no Senado, não enviar a mensagem e, assim, inviabilizar ele próprio a sabatina de Messias. O cancelamento neutraliza esse mecanismo.
Por isso, parlamentares passaram a dizer que “o jogo voltou ao zero”. A indicação continua dependendo do envio formal da documentação, mas a partir de agora quem controla o relógio é Alcolumbre, não o Executivo.
Agenda zerada e margem de manobra ampliada
Com o recuo, Alcolumbre reconstruiu seu espaço político e regimental. Ele passou a ter respaldo para marcar a sabatina no tempo que considerar adequado, mesmo após o recebimento da mensagem presidencial. Como a interrupção do calendário decorreu de uma omissão do governo, o presidente do Senado também fica blindado contra críticas internas caso decida espaçar as etapas do processo.
A dinâmica altera o tabuleiro:
Messias continua dependente da articulação política, pois enfrenta resistências entre senadores; Lula perde a vantagem do veto tácito via não envio de documentos; O Senado recupera primazia sobre o rito e sobre a velocidade do exame.
A dimensão jurídica e política do rito
A Constituição fixa a divisão de competências: o presidente indica, o Senado sabatina e aprova. Mas o Regimento Interno regula o como — e é aqui que se revela o peso do episódio. A tentativa de agendar uma sabatina sem documentação e a posterior reversão expõem que, no exame de indicações ao STF, tempo é poder.
O recuo, portanto, não é mero ajuste burocrático. É uma reafirmação de que o Senado não se submete a cronogramas impostos por omissão do Executivo e de que o controle do rito faz parte da autocontenção institucional necessária para preservar o equilíbrio republicano.
Para governo e Senado, o adiamento oferece algo valioso: tempo para repactuar a relação, reduzir atritos e permitir que o indicado percorra a Casa em busca de apoios. Mas o movimento também deixa um recado: sem observância plena da liturgia formal, não há avanço possível no processo de escolha de ministros da Suprema Corte.
Processo de nomeação de Jorge Messias ao STF segue sob tensão exposta no Senado
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