A Terceira Seção do STJ irá firmar entendimento sobre a possibilidade de reconhecer o cuidado materno como atividade laborativa para fins de remição de pena, nos termos do artigo 126 da LEP, diante do princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção integral da criança.
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça deve concluir, nesta terça-feira (5), o julgamento de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em favor de uma mulher presa que permaneceu na ala de amamentação da Penitenciária Feminina de Mogi Guaçu cuidando de seu filho recém-nascido.
O caso levanta debate inédito sobre a possibilidade de se considerar o cuidado materno como atividade equivalente ao trabalho para fins de remição de pena, nos termos do artigo 126 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984).
A remição da pena por trabalho ou estudo é tradicionalmente admitida em favor de condenados que cumprem pena em regime fechado ou semiaberto. A legislação estabelece que a cada três dias de trabalho, um dia da pena pode ser remido. O mesmo se aplica ao estudo, na proporção de 12 horas distribuídas em ao menos três dias. No entanto, não há previsão expressa quanto à remição por atividades de cuidado, como a maternidade exercida no ambiente prisional.
Neste caso, a Defensoria sustenta que a amamentação e o cuidado exclusivo de filhos lactentes configuram atividade de natureza laborativa, com alto grau de esforço físico e emocional, além de nítido valor social. A tese é de que tais cuidados se inserem na chamada “economia do cuidado”, conceito reconhecido por organismos internacionais como a ONU e a OIT, que compreende atividades historicamente atribuídas às mulheres e que, embora não remuneradas, sustentam a vida e a coletividade.
O pedido baseia-se em interpretação extensiva do artigo 126 da LEP, combinada com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III), da proteção integral da criança (art. 227) e da individualização da pena (art. 5º, XLVI), bem como nas Regras de Bangkok, conjunto de diretrizes da ONU para o tratamento de mulheres presas e medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras.
O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, já proferiu voto favorável à concessão da ordem, reconhecendo o direito à remição com base no cuidado materno prestado pela presa em tempo integral. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do ministro Joel Ilan Paciornik.
Caso prevaleça a tese da Defensoria, o julgamento poderá abrir precedente importante para milhares de mulheres em situação de cárcere que se encontram impedidas de trabalhar ou estudar formalmente por exercerem cuidados exclusivos com filhos lactentes em estabelecimentos penais.