O Superior Tribunal de Justiça decidiu que os herdeiros não podem cobrar retroativamente os aluguéis recebidos por pessoa que, durante anos, administrou os imóveis com o conhecimento e o consentimento dos proprietários falecidos.
Segundo a Corte, a situação jurídica consolidada em vida — isto é, o reconhecimento tácito e prolongado de que outra pessoa administrava e usufruía dos rendimentos — se transmite integralmente aos herdeiros.
Situação jurídica consolidada
O julgamento reforça que o direito de herdar não cria uma nova relação patrimonial, mas dá continuidade àquela que o falecido deixou constituída. Pelo princípio da saisine, os sucessores assumem não apenas os bens e direitos, mas também os limites que o falecido havia criado por seus próprios atos.
Assim, se o antigo proprietário tolerou ou consentiu, por longo tempo, que alguém administrasse e recebesse os frutos do imóvel, essa realidade se incorpora ao patrimônio transmitido, impedindo a exigência de restituição retroativa.
Boa-fé e proteção da confiança
A decisão também se apoia nos princípios da boa-fé objetiva e da proteção da confiança legítima. Para o STJ, o comportamento duradouro do falecido criou uma expectativa estável de que o administrador poderia continuar a receber os aluguéis. Permitir que os herdeiros desfaçam essa situação após o falecimento violaria a segurança jurídica e representaria comportamento contraditório, vedado pelo direito civil.
Supressio e surrectio
O Tribunal destacou ainda os institutos da supressio e da surrectio, que se aplicam quando o titular de um direito, por sua inércia ou consentimento prolongado, perde a possibilidade de exercê-lo, ao mesmo tempo em que o outro adquire uma expectativa legítima de continuar na situação criada. Nesse contexto, os herdeiros não podem “reviver” direitos que o falecido já havia, na prática, renunciado a exercer.
Em síntese, o STJ entendeu que a herança transmite não só o patrimônio, mas também as condições jurídicas que o envolvem. Por isso, quem herda imóvel alugado não pode exigir a devolução dos valores recebidos por administrador autorizado — ainda que implicitamente — pelos proprietários falecidos.
