Usar jaqueta grossa de frio em dia de calor não autoriza abordagem pessoal, diz STJ

Usar jaqueta grossa de frio em dia de calor não autoriza abordagem pessoal, diz STJ

O mero fato de uma pessoa usar uma jaqueta grossa em dia de calor não confere fundadas suspeitas para abordagem pessoal.

Com esse entendimento, o ministro Joel Ilan Paciornik, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu a ordem em Habeas Corpus para absolver um homem condenado por tráfico de drogas.

O réu foi abordado por guardas municipais por volta das 13h30 de um dia quente. Ele carregava um estojo com 47 porções de cocaína e três de maconha. Por isso, foi condenado a cinco anos e dez meses de reclusão, em regime inicial fechado.

A Defensoria Pública de São Paulo levou o caso ao STJ em Habeas Corpus, por entender que as provas que embasaram a condenação são ilícitas, pois decorreram de ação açodada de agentes da guarda municipal.

Em juízo, os guardas justificaram a abordagem pessoal por terem visto um homem vestido com uma jaqueta grossa, de frio, embora fizesse bastante calor. E também porque o suspeito estava parado, sozinho e em local conhecido como ponto de tráfico de drogas.

Abordagem pessoal e moda

O ministro Paciornik observou que a guarda municipal pode agir ao se deparar com uma situação explícita de fundada suspeita, promovendo a abordagem de suspeitos, na linha do que decidiu o Supremo Tribunal Federal.

Esse não foi o caso dos autos, no entanto. O direito de ir e vir do suspeito foi interrompido apenas porque trajava uma blusa em uma situação de anormalidade, já que não fazia frio.

Segundo o ministro, ninguém pode adivinhar as razões pelas quais alguém usa uma blusa. Ele elencou algumas hipóteses possíveis: estilo, estado febril, simples opção ou tantas outras.

“A questão que se coloca é: por que aquele que traja blusa é suspeito e o que traja blazer ou terno não o é? A opção de investigar uns e não outros é, induvidosamente, uma escolha seletiva, aleatória e que, por isso mesmo, não encontra parâmetro de legalidade.”

“Nesse passo, as razões únicas e exclusivas, invocadas pelos agentes municipais, para avançarem sobre a liberdade do paciente não são lídimas, redundando, daí, a invalidez de todo o acervo probatório, porque decorre do primeiro ato de persecução”, concluiu o magistrado.

Jurisprudência paradoxal

As razões que permitem a abordagem de pessoas na rua ainda estão sendo analisadas e definidas pela jurisprudência do STJ, tribunal responsável por dar a última palavra na interpretação do Direito Federal.

A premissa básica é a de que são necessárias fundadas razões que possam ser concretamente aferidas e justificadas a partir de indícios. Isso elimina a ação baseada exclusivamente na percepção policial. Na prática, sabe-se que essas ações são contaminadas por preconceitos como os de classe ou raça.

Aos poucos, porém, o STJ percebeu que essa análise precisaria ser mais flexível. Assim, denúncia anônima e intuição policial não justificam que alguém seja parado e revistado na rua. Por outro lado, fugir ao ver a polícia é motivo suficiente.

Entre os exemplos de construção dessa jurisprudência, estão os julgados em que o STJ concluiu ser ilícita a ação da polícia motivada pelo mero fato de duas pessoas estarem em uma moto ou pelo motorista estar usando capacete em local onde isso não é a praxe.

Estar em ponto de tráfico e ser conhecido no meio policial também não bastam para esse tipo de ação dos agentes.

Em sentido oposto, demonstrar nervosismo ao ver a presença policial pode bastar para a busca pessoal, desde que aliado a outros fatores.

HC 966.815

Com informações do Conjur

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