O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por maioria de votos (8 a 2), que não há omissão inconstitucional do Congresso Nacional na regulamentação do artigo 245 da Constituição, que prevê assistência estatal a herdeiros e dependentes de vítimas de crimes dolosos.
O julgamento da ADO 62, encerrado em sessão virtual afastou a tese de que a demora legislativa configuraria inércia deliberada. O ministro Edson Fachin declarou-se suspeito e não participou.
A ação foi ajuizada em 2021 pelo então procurador-geral da República, Augusto Aras, sob o argumento de que a falta de regulamentação inviabilizava o acesso a um direito constitucional de proteção mínima às famílias carentes impactadas por crimes dolosos.
Para Aras, a mora legislativa comprometia a dignidade da pessoa humana, o mínimo existencial e a proteção das famílias, sendo necessária uma lei específica para garantir assistência.
O Senado Federal sustentou que tramitam no Congresso cinco projetos de lei sobre o tema. Já a Advocacia-Geral da União pediu a improcedência, lembrando que políticas assistenciais disputam recursos com áreas prioritárias como saúde, educação e previdência.
Prevaleceu o voto do relator, ministro Dias Toffoli, que considerou que o panorama normativo atual já contempla políticas voltadas à proteção das vítimas e de seus familiares, ainda que de forma setorial. Citou como exemplos a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), a pensão especial a filhos de vítimas de feminicídio e o atendimento emergencial prestado pelo Sistema Único de Saúde a vítimas de violência sexual.
Para o ministro, o art. 245 deve ser interpretado em sintonia com o art. 5º, inciso LXXIV, que garante assistência jurídica gratuita aos necessitados, destacando um “esforço comum dos entes federados” no amparo a vítimas de crimes. Foram acompanhados os votos de Alexandre de Moraes, André Mendonça, Nunes Marques, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Gilmar Mendes.
O ministro Flávio Dino abriu divergência ao reconhecer a existência de mora inconstitucional. Segundo ele, políticas públicas parciais não substituem o dever de regulamentação do dispositivo constitucional, que traria um “plus normativo” ao dever de assistência estatal. Defendeu que o Congresso fosse intimado a editar lei específica no prazo de 18 meses. Sua posição foi acompanhada pela ministra Cármen Lúcia.
Com o resultado, o STF firmou entendimento de que o Congresso não está em mora inconstitucional e que o artigo 245 da Constituição já encontra respaldo em políticas públicas existentes, ainda que não regulamentado por lei própria.