Porta amassada de carro não é motivo para polícia definir fundada suspeita e apreender, decide STJ

Porta amassada de carro não é motivo para polícia definir fundada suspeita e apreender, decide STJ

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o simples fato de um veículo trafegar com porta amassada não autoriza a polícia a realizar abordagem e busca veicular.

O entendimento foi firmado pelo ministro Ribeiro Dantas, que reconheceu a ilegalidade da diligência policial e determinou o trancamento da ação penal movida contra o paciente, réu em ação penal, denunciado por porte ilegal de arma de fogo de uso permitido. 

Abordagem motivada por aparência do veículo

Segundo os autos, o acusado foi parado por policiais militares em São Paulo apenas porque o carro apresentava uma das portas amassadas. Durante a revista, ele tentou se identificar como guarda municipal e portava uma arma, posteriormente identificada como simulacro. A defesa impetrou habeas corpus alegando ausência de fundada suspeita, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a validade da abordagem.

Ao reexaminar o caso, o ministro Ribeiro Dantas destacou que a irregularidade estética do automóvel não configura indício de crime, nem justifica medida invasiva. Para o relator, tratou-se de “abordagem exploratória, desprovida de fundamentação concreta”, realizada sem qualquer comportamento suspeito ou indício de ilicitude por parte do condutor.

Fundada suspeita exige elementos objetivos

Com base no artigo 244 do Código de Processo Penal, o STJ reafirmou que a busca pessoal ou veicular só é legítima quando fundada em elementos objetivos e verificáveis, e não em impressões subjetivas, intuições ou mera aparência. “A mera situação de estar a bordo de veículo com a porta amassada não constitui, por si só, fundada suspeita”, escreveu Ribeiro Dantas.

O ministro citou precedentes da Corte — como o HC 774.140/SP e o RHC 158.580/BA, relatados pelo ministro Rogerio Schietti Cruz — que vedam abordagens baseadas em nervosismo, espanto ou condições genéricas do veículo, por configurarem “fishing expeditions” (buscas exploratórias sem base probatória mínima).

Provas ilícitas e trancamento da ação

Ao reconhecer a nulidade da busca e apreensão, o STJ considerou ilícitas todas as provas derivadas do ato, aplicando a teoria dos frutos da árvore envenenada (art. 157 do CPP).
Mesmo sem conhecer formalmente o habeas corpus — por ser substitutivo de recurso próprio —, o ministro concedeu a ordem de ofício, determinando o trancamento da ação penal nº 1504367-17.2025.8.26.0228, que tramitava na Justiça paulista.

Garantias constitucionais

A decisão reforça o entendimento de que a inviolabilidade da intimidade e da vida privada (art. 5º, X, da Constituição) não pode ser relativizada sem justificativa concreta. Para o relator, a atuação policial deve observar parâmetros de proporcionalidade e razoabilidade, sob pena de violar o devido processo legal e gerar nulidade das provas.

“Não bastam impressões subjetivas nem o simples mau estado de conservação do veículo. A busca pessoal e veicular exige motivo real, objetivo e demonstrável”, concluiu Ribeiro Dantas.

HC 1.002.334

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